Revista ACP março

16 | AUTOMÓVEL CLUB DE PORTUGAL MARÇO 2025 SÉRGIO GONÇALVES Eurodeputado pelo PS OPINIÃO As mudanças em curso no setor automóvel representam uma das transformações mais complexas e estruturantes da indústria europeia das últimas décadas, do ponto de vista económico e ambiental. O Plano de Ação para o Setor Automóvel, recentemente apresentado pela Comissão Europeia, configura um esforço relevante para modernizar o setor, promovendo a transição ecológica, digital e industrial. A indústria automóvel é um dos principais motores da economia europeia, empregando direta ou indiretamente mais de 13 milhões de pessoas, o que representa cerca de 6,1% do total da força de trabalho da União Europeia. O setor contribui com cerca de 7% para o Produto Interno Bruto da UE. Isto demonstra a relevância desta indústria na manutenção da competitividade europeia e na necessidade que a Europa tem de garantir um ecossistema industrial robusto e resiliente. Face à necessidade de descarbonizar esta indústria e à crescente concorrência de países terceiros, como a China, há muito que os socialistas europeus defendem uma reindustrialização da UE, assente na transição verde e na autonomia tecnológica da Europa. Este Plano de Ação vem agora responder, em parte, à nossa visão. Este reconhece a necessidade de fortalecer cadeias de valor internas, por exemplo, na produção de baterias. Para além disso, este Plano tem como objectivo garantir o acesso a matérias-primas a custos reduzidos para aumentar a competitividade da indústria europeia, através de financiamento direto, de empréstimos competitivos e da agregação das necessidades dos produtores. A Comissão Europeia irá também apoiar os Estados-Membros no desenvolvimento de uma rede de infraestruturas de carregamento, fundamental para aumentar a procura por veículos elétricos na União. São alterações positivas e que seguem o caminho que o Relatório Draghi evidenciou: o crescimento económico passará inevitavelmente pelo investimento na economia verde como fator impulsionador da competitividade europeia. Há ainda quem defenda que, para garantir a competitividade, temos de reduzir a nossa ambição na transição energética. Para além de todos os argumentos climáticos contra esta posição, atrasar a transição para veículos não poluentes, como defendem os partidos de direita no Parlamento Europeu, manteria a dependência da Europa em combustíveis fósseis, importados maioritariamente de países terceiros e vulneráveis a flutuações de preço resultantes do contexto geopolítico. Acresce a isto, o facto de concorrentes diretos, como a China, já terem feito uma aposta clara na eletrificação de viaturas, o que significa que uma diminuição da nossa ambição deixaria a Europa ainda mais atrasada em termos de competitividade. Dito isto, este Plano apresenta insuficiências que merecem ser realçadas. Se, por um lado, é suficientemente pragmático para reconhecer que alguns trabalhadores terão de mudar de indústria por causa da transição verde, falha em oferecer novas soluções para além dos instrumentos já existentes, introduzindo apenas um novo sistema de monitorização de setores em risco. Estudos demonstram que a transição verde tem criado mais empregos do que os que tem eliminado, mas é necessário apoiar diretamente a requalificação de trabalhadores, pois estes novos empregos requerem outras qualificações. Esta transição requer tempo e recursos financeiros a que alguns trabalhadores não têm acesso, daí o dever e a responsabilidade de financiamento público para os apoiar. Da mesma forma, este Plano não oferece soluções para a concorrência desleal existente no mercado, nem pressiona países terceiros que criam distorções artificiais no mercado através de subsídios estatais e práticas de dumping. Por fim, na maior parte dos casos carece de detalhes sobre o volume de financiamento disponível e não estabelece metas nem clarifica que instrumentos vão apoiar as empresas europeias. A União Europeia tem uma oportunidade para se posicionar na vanguarda da indústria automóvel sustentável, mas essa liderança só será possível se houver um compromisso inequívoco com políticas industriais ambiciosas baseadas na inovação europeia, financiamento adequado e estabilidade regulatória. A União Europeia tem uma oportunidade para se posicionar na vanguarda da indústria automóvel sustentável O Plano de Ação para o Setor Automóvel da Comissão Europeia é um primeiro passo, cauteloso, na direção certa. Os socialistas europeus continuaram a exigir uma abordagem mais ambiciosa e estruturada para garantir um futuro sustentável, competitivo e socialmente justo para a indústria automóvel europeia. ● O futuro da indústria automóvel europeia C M Y CM MY CY CMY K

RkJQdWJsaXNoZXIy Mjc2MDEwOQ==