Revista ACP outubro

AUTOMÓVEL CLUB DE PORTUGAL OUTUBRO 2024 | 33 Há vários simbolismos que transportam os portugueses para o ano de 1974: as longas barbas fardadas, os discursos sérios de quem tentar montar uma democracia no meio do caos, o ambiente político escaldante que fazia ferver as ideologias. Mas nada bate as viagens para o Algarve, com as suas longas noites de preparativos, a cozinhar para um regimento em trânsito, a organizar as várias malas que esvaziavam os armários, a sonhar com a “Saint-Tropez” portuguesa acabada de nascer. Nem toda a população o pôde fazer, é certo, mas quem o fez queria lá saber das acusações de “burguês”. Queria era praia e tinha de ser nas águas cálidas do Algarve. O ano de 1974 foi o da consagração de uma classe média emergente, num setor de serviços em franco crescimento, que se apresentou com mais liberdade de movimentos e pensamentos. E desejos, também. Os 22 dias de férias pagas acabados de chegar com a Revolução de Abril ajudaram. Os novos turistas faziam parte de um país com 8,8 milhões de pessoas, em que só havia 66 quilómetros de autoestrada (hoje são mais de 3 mil) e dispunham de um parque automóvel que não chegava ao milhão de viaturas (hoje são cerca de 6,5 milhões). Mas para chegar ao paraíso era preciso passar por um calvário: as estradas para o Algarve. “Já chegamos?” As viagens de carro eram feitas intervalando o entusiasmo com o tédio, o sono, os jogos das marcas e das matrículas, o jogo do Stop (em que cada letra corresponde ao maior número possível de palavras), os ralhetes dos pais que ao fim de dez horas quase consecutivas de condução já tinham os ouvidos “moídos” pelo barulho do motor, pelo vento abrasador que entrava pelas janelas e pelas vozes das crianças que insistiam: “quando é que chegamos?”. O boom do Algarve Lá em baixo, no Sul do país, o Algarve, que também se apresentava como uma zona emergente, cobiçada pelas suas praias idílicas e desertas. A inauguração do Aeroporto de Faro em 1965 abriu as portas ao turismo de massas. Foi um momento fulcral para a região, que assim saiu do esquecimento e da incúria do poder central, para passar a ser uma lança cravada no mapa do turismo mundial. Começavam a nascer os primeiros hotéis de cinco estrelas, como o Penina, Balaia, Alvor (na foto) ou Dona Filipa. Um dos primeiros clubes noturnos foi Sete e Meio. •

RkJQdWJsaXNoZXIy ODAwNzE=