Revista ACP setembro

14 | AUTOMÓVEL CLUB DE PORTUGAL SETEMBRO 2023 Ópera a preço de opereta Rowan Atkinson, o conhecido Mr. Bean escreveu um artigo em que afirmou: “Adoro carros elétricos, mas sinto-me cada vez mais enganado”. Deu várias razões. A mais proeminente foi o estudo da Volvo que afirma que o fabrico de um carro elétrico emite até 70% mais gases de efeito de estufa que um carro a combustão interna. Mas o mesmo estudo também afirma que, numa quilometragem de 200.000 kms, um carro elétrico emite entre 10 a... 50% menos gases mesmo incluindo o seu fabrico. Acrescentou também que as baterias duram cerca de 10 anos. Mas elas duram “mais” de 10 anos. Quem comprou os primeiros BMW i3, lançados em 2013, sabem bem que as suas baterias duram que se fartam, embora vão perdendo capacidade de carga, tal como um motor a gasolina aumenta o consumo ao longo da vida. Argumenta-se também com os custos ambientais na sequência da extração mineira e refinação do lítio. Mas... que dizer da bombagem de petróleo das entranhas da terra e do fundo do mar e das refinarias, com os seus bicos de gás metano a queimar em permanência? Ah! E se a eletricidade vier de centrais a carvão? Simples: nesse caso, um carro elétrico polui muito mais. Só que a nossa matriz energética em 2022 foi 57,2% renovável e, dos restantes 42,8%, mais de metade foi gás natural, menos poluente que a gasolina. Se, como é o meu caso, tiver uns míseros 8 painéis solares em casa então fique tranquilo: pode andar até 100 kms por dia sem emitir um grama de CO2 ou 3.000 por mês, e de borla!... Deixar um 296 GTB para trás ao sinal verde ao volante de um i60 – um SUV a metade do preço – dá vontade de sorrir. Para não falar em gastar menos de metade dos custos de rodagem, zero – repito – zero custos de manutenção em 2 anos, conforto sonoro digno de um Rolls-Royce, binário sempre disponível... só falta uma coisa, a passagem às baterias sólidas o que trará ainda mais autonomia e durabilidade. Já agora, fui a Madrid múltiplas vezes – uma paragem de 25m no Ionity de Mérida – e uma média de 120 kms/h. Custo do carregamento em casa: 7,5€, Custo do carregamento no Ionity: 22,5€. Custo total ida e volta: 60€. Tentem lá isso com um diesel! • Mobilidade elétrica: solução única? A questão da mobilidade elétrica está indiscutivelmente associada à necessidade de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, particularmente do CO2. Muitas vezes a discussão em relação às virtudes e insuficiências da eletrificação da mobilidade, tem-se restringido aos automóveis ligeiros. E sendo os associados do ACP, maioritariamente condutores desse tipo de veículos, vou manter essa abordagem, embora não podendo deixar de referir que a mobilidade é muito mais abrangente que isso, quer em termos de modos (rodoviário, ferroviário, aéreo e marítimo) quer do que é transportado (pessoas ou mercadorias) e das distâncias a percorrer. Embora reconheça que a eletrificação é uma tendência irreversível, é, em minha opinião, um erro defini-la como a via única. Sem ser exaustivo, apontarei algumas razões. Primeiro, o estado de desenvolvimento da economia nos vários países é muito diverso pelo que, nalguns casos, poderá levar décadas até que se consiga uma taxa de eletrificação com alguma materialidade. Segundo, a mobilidade elétrica não significa “emissões zero” como é erradamente anunciado. Se considerarmos o ciclo de vida completo, incluindo a produção da eletricidade, a fabricação do veículo, a sua utilização e o desmantelamento, em muitos casos o saldo poderá ser desfavorável a esta solução. Além disso obrigará a um enorme esforço de substituição da infraestrutura de produção, distribuição e carregamento, que nem todas as economias poderão suportar. Estão ainda por aferir a disponibilidade de matérias-primas bem como o impacto ambiental da sua exploração. Como via complementar, a utilização de combustíveis de baixo carbono, biocombustíveis sustentáveis e combustíveis renováveis de origem não biológica, poderá suprir algumas das limitações da eletrificação, acelerar a descarbonização porque podem ser usados nos veículos atuais e com a infraestrutura existente, evitando assim muitos ativos ociosos e ajudando a uma transição justa que não deixe ninguém para trás. • Elétricos: mito ou realidade? RICARDO MONTEIRO GLOBAL PRESIDENT HAVAS (REFORMADO) ANTÓNIO COMPRIDO SECRETÁRIO GERAL DA APETRO OPINIÃO OPINIÃO

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